sábado, 31 de dezembro de 2016

D. Carlos I "O Mártir" (1889 - 1908)

D. Carlos I
D. Carlos, sendo filho de D. Luís, conservou alguns dos traços da personalidade de seu pai, como o amor pela cultura, as artes e os oceanos (com o especial contributo de ter impulsionado a oceanografia enquanto ciência). Mas logo no início da sua governação, enfrentaria o Ultimato Britânico, a 11 de janeiro de 1890. Os britânicos forçariam Portugal a desocupar o território situado entre Angola e Moçambique, sob pena de poder ser declarada a guerra contra Portugal. A retirada de Portugal acabaria por constituir uma enorme humilhação para o povo lusitano, em especial por ter sido consumada pela mão do mais antigo e leal aliado. A sociedade portuguesa acabaria por manifestar o seu profundo desagrado, essencialmente com a revolta militar no Porto em janeiro de 1891, capitalizada pelas forças republicanas. Esta seria a primeira tentativa desenvolvida pelos republicanos para derrubar a monarquia em Portugal, apenas contida pela intervenção da Guarda Municipal, que com uma carga de fuzilaria conseguiu desmobilizar a multidão e os militares que a apoiavam. Um conjunto de revoltosos conseguiriam ainda resistir dentro da Câmara Municipal mas a Guarda, com o auxílio de fogo de artilharia e do Regimento de Infantaria n.º 18, conseguiu forçar os revoltosos à rendição e acabou assim com a revolta republicana. Apesar da revolta dos republicanos e da derrota diplomática com o Reino Unido, D. Carlos I soube tirar partido destes acontecimentos e recentrar Portugal na cena diplomática internacional. O Rei rapidamente colocou em marcha um plano para fortalecer a posição de Portugal no teatro da diplomacia internacional e acabaria por deslocar-se várias vezes ao estrangeiro, conseguindo, inclusivamente, que a primeira visita oficial de Estado que Eduardo VII do Reino Unido realizasse fora do seu país, tivesse Portugal como destino. D. Carlos I seria ainda o anfitrião de muitos outros monarcas que visitariam Portugal, como Afonso XIII de Espanha, a rainha Alexandra do Reino Unido, Guilherme II da Alemanha e até o Presidente da República Francesa, Émile Loubet. E tal como D. Carlos receberia muitos chefes de Estado no seu país, também D. Carlos visitaria os respetivos países dos seus convidados em sinal de agradecimento pela hospitalidade demonstrada, sendo este período considerado como um período de ouro para a nossa diplomacia externa. No plano da economia, diversas medidas foram tomadas para estabilizar com alguma urgência o quase colapso português. Em 1891 seriam diminuídos os salários dos funcionários públicos e seriam aumentados os impostos sobre os juros da dívida comprada por titulares nacionais. No ano seguinte, seria adotado o mesmo princípio mas sobre os juros da dívida comprada por titulares estrangeiros. Estas medidas permitiram cortar rapidamente os juros exigidos pela dívida nacional, e a par destas medidas, foram ainda introduzidas medidas protecionistas nas alfândegas de Portugal e das suas colónias e seria também abandonado o padrão-ouro para emitir moeda suficiente para financiar a economia nacional. Portugal faria apenas em 1902 um acordo com os seus credores, deixando de poder recorrer aos mercados de capitais externos, mas garantiu nesse período, e até final da monarquia, a realização de orçamentos equilibrados (aliás, o equilíbrio orçamental seria alcançado em 1897, conseguindo Portugal evitar a acumulação de dívida externa). A inflação foi controlada, e o protecionismo em vigor conseguiu promover uma nova vaga de industrialização no território nacional. Mesmo assim, as medidas de promoção económica seriam insuficientes para manter o otimismo no povo português, cada vez mais desgastado pelas crises políticas vividas em Portugal. No âmbito político, O Rei D. Carlos deparou-se com um sistema político doente, entre os quais os dois principais partidos políticos (o Regenerador e o Progressista) se alternavam na governação. Este período ficaria conhecido como o período do “Rotativismo”, em que a queda de um governo dava sempre lugar a outro novo chefiado por quem se encontrava na oposição. Este sistema rotativo levou a um rápido desgaste junto da opinião pública em relação ao sistema político, e no início do novo século, ocorreria uma cisão no partido Regenerador, surgindo o Partido Regenerador Liberal liderado por João Franco. Em 1905, ocorre uma cisão semelhante mas no Partido Progressista, desgastando ambos os partidos e contribuindo para a volatilidade do sistema político. A contestação nas ruas crescia de forma assinalável, e com ela cresciam também os apoios em torno do Partido Republicano. Em 1906, com uma nova queda de governo, o Rei decide dar posse a João Franco como líder do novo executivo. Os Regeneradores Liberais aliar-se-iam aos Progressistas e com esta nova coligação João Franco poderia avançar com um conjunto de reformas importantes, como o novo plano de contabilidade pública, a liberdade de imprensa e a repressão anarquista. Em 1907, o partido Progressista acabaria por retirar o apoio ao governo de João Franco, numa tentativa de lhe retirar de imediato o apoio que sustentava o seu funcionamento e conseguir com isso provocar novas eleições. Mas aqui, o Rei D. Carlos interveio e seguraria o governo de João Franco apoiando-o firmemente. Aí, Franco conseguiria convencer o próprio D. Carlos a dissolver o parlamento e a não convocar novas eleições, podendo assim continuar a governar, no que se aproximou de seguida a um período de governação ditatorial ou absolutista, sem qualquer interferência da oposição. Em reação, toda a oposição lançou uma forte campanha anti governo. O país estava perante uma ditadura administrativa, e o Rei começava a ser muito criticado nas ruas do país. A própria família real estava contra a posição de D. Carlos e considerava que o Rei não deveria imiscuir-se nos trabalhos do parlamento. O próprio Rei sabia que ao assinar o decreto de dissolução do parlamento estaria a condenar o seu futuro enquanto Rei de Portugal. Pelo que daí até ao regicídio, seria um passo muito pequeno. O regicídio efetivo seria ainda precedido pela tentativa de um golpe de estado em janeiro de 1908. Vários líderes do movimento conspirador seriam detidos, entre os quais Afonso Costa. João Franco continuaria no poder, e gozava agora de uma autonomia reforçada pelas novas eleições que mesmo assim lhe haviam proporcionado uma maioria governativa. De realçar que as eleições no início do século não eram asseguradas nem representavam o universo da população portuguesa. Eram muito poucos aqueles que votavam, e quase sempre os mais abastados e educados. Como o processo eleitoral excluía o povo, e este era sempre o segmento mais largo da população e também o mais prejudicado pela instabilidade governativa e caos económico, o descontentamento geral da sociedade acabava por não transparecer no resultado das eleições. O clima de tensão vivia-se e respirava-se em Portugal. Conspirava-se contra o próprio Rei. João Franco preparou um decreto para exilar no estrangeiro ou expulsar para as colónias, sem qualquer tipo de julgamento, todo e qualquer individuo que participasse em atendados à ordem pública. O Rei D. Carlos I assinaria este decreto ainda em janeiro de 1908, em Vila Viçosa, sabendo que provavelmente assinaria a sua própria pena de morte, e é aquando do seu regresso a Lisboa, a 1 de fevereiro de 1908, que é cometido de facto o regicídio. A família real subiria para uma carruagem aberta, na sua chegada ao Terreiro do Paço, para seguir em direção ao Palácio das Necessidades. Encontrava-se uma multidão enorme no Terreiro do Paço e quando a sua carruagem inicia o trajeto, são disparados vários tiros contra o Rei, que morreria no local, assim como o príncipe herdeiro D. Luís Filipe. D. Manuel, o filho mais novo, é ferido num braço. A guarda real, por sua vez, abate prontamente os presumíveis homicidas: Alfredo Costa e Manuel Buíça, ambos pertencentes ao movimento republicano. A sua morte indignaria toda a Europa, mas a memória de D. Carlos perduraria até hoje. Ele foi o responsável pelos planos para a eletrificação das ruas de Lisboa, tendo chegado a eletrificar o próprio Palácio das Necessidades. Por ser um apaixonado pelo mar, é por sua mão que nasceria o Aquário Vasco da Gama. Foi também responsável por muitos trabalhos oceanográficos, alguns deles pioneiros no mundo.

Principais pontos a destacar na governação de D. Carlos I:
• Enfrenta o Ultimato Britânico, sendo forçado a desocupar os territórios entre Angola e Moçambique, face à eminente declaração de guerra de Inglaterra;
• Após esse momento, decide encetar contactos diplomáticos internacionais, conseguindo aproximar-se dos maiores estadistas da Europa com relativo sucesso;
• No plano económico, consegue-se o equilíbrio orçamental, abandona-se o padrão-ouro e evita-se a acumulação de nova dívida externa. Um novo regime protecionista é promovido e uma nova vaga de industrialização surge em Portugal;
• No plano político deparou-se com uma grande instabilidade governativa, algo que conduziu à nomeação de João Franco para o governo e a um regime quase absolutista de governação;
• A impopularidade do governo de João Franco fortaleceu a base de apoios do movimento Republicano, levando ao regicídio de 1908.

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