sábado, 31 de dezembro de 2016

Introdução

Esfera armilar e brasão de Portugal
Este é um livro sobre a Governação dos Reis de Portugal. Escrito para que qualquer leitor possa compreender a história por trás do legado e das grandes decisões que os Reis de Portugal deixaram para o mundo e para os portugueses. Neste livro são explorados segredos, batalhas, decisões políticas e económicas, alianças diplomáticas, casamentos e relações familiares, que em muito influenciariam a ação governativa dos Reis de Portugal. Este é por isso um livro que, acima de tudo, conta a história da governação dos nossos reis, de forma acessível e prática para todos. É no fundo um livro obrigatório para todos os que sentem orgulho em Portugal e para todos os que querem conhecer de forma clara e objetiva como os nossos 34 Reis governaram e que exemplos nos deixaram. A Governação reveste-se de muitas formas. E este livro procura compreender como cada Rei influenciou decisivamente o país pelas suas decisões nas esferas política, social, cultural, religiosa, económica, administrativa e militar ao longo de quase 800 anos. Esta é uma viagem no tempo, e é uma viagem pelos meandros da Governação dos nossos Reis, desde o século XII até ao início do século XX. Esta viagem é uma descoberta para qualquer leitor que procure conhecer a própria história de Portugal centrada na perspetiva da Governação dos seus Reis. Ao longo das próximas páginas, visitaremos todos os nossos reinados, dinastia a dinastia e por ordem cronológica. Este livro está organizado em quatro secções, sendo cada secção dedicada a uma dinastia. Nesta obra, deixaremos de parte alguns aspetos mais pessoais da vida dos nossos reis, dado que esta não se trata de uma obra biográfica individual ou extensiva sobre cada um dos reinados. Este é, essencialmente, um livro para aqueles que querem conhecer, de forma objetiva e concreta, as principais decisões dos Reis de Portugal e como estas contribuíram significativamente para marcar a nossa história enquanto país e sociedade, na perspetiva de um curioso que não se pretende substituir de forma alguma ao trabalho de qualquer historiador, mas que espera que qualquer leitor acolha esta obra com curiosidade e paixão, e principalmente, a tome como uma fonte de conhecimento imperdível e obra de referência sobre Portugal.

D. Afonso Henriques "O Conquistador" (1143 - 1185)

D. Afonso Henriques
D. Afonso Henriques ou Afonso I foi o primeiro rei de Portugal e o pai da nacionalidade portuguesa. Filho de pai francês, D. Henrique de Borgonha e de mãe Galega, D. Teresa de Leão, nasceu provavelmente em 1109, em local incerto, embora as várias teses apontem Guimarães, Viseu e Coimbra como os sítios mais prováveis. Seus pais eram condes do Condado Portucalense, um condado sob alçada do reino de Leão. O Reino de Leão foi um dos principais reinos ibéricos surgidos no período da reconquista cristã. Foi constituído em 910 com a divisão do Reino das Astúrias pelos filhos do Rei Afonso III: Garcia, ficou com o Reino de Leão, Ordonho com a Galiza e Fruela com as Astúrias. Mais tarde, os reinos seriam outra vez reunificados no Reino de Leão. Em 1037, Bermudo III, o novo Rei de Leão foi derrotado e morto em batalha por Fernando I de Castela, sendo que Fernando I de Castela passou a ser designado por Fernando Magno, Rei de Castela e Leão. Fernando Magno morreria em 1065, deixando o Reino de Castela e Leão dividido em 3 partes, uma para cada filho: Sancho ficou com Castela, Afonso com Leão e Garcia com a Galiza. Afonso viria a combater ferozmente os seus irmãos, e acabando por os dominar, reunificaria todos os reinos. Afonso VI de Leão proclamou-se então imperador de toda a Espanha, sendo a capital do novo império a velha cidade de Leão. Esta situação manteve-se ao longo dos reinados de Urraca, filha de Afonso VI de Leão, e seu neto Afonso VII. O Reino de Leão só viria a findar em 1230, quando Fernando III de Castela, filho de Afonso IX de Leão, se apoderou do trono que pertencia às legítimas herdeiras, as filhas de Afonso IX de Leão e suas meias-irmãs, pondo cobro à Dinastia de Borgonha, que governou o reino entre 1126 a 1230. O Condado Portucalense, por sua vez, foi fundado em 868, sendo o seu primeiro conde Diogo Fernandes. Já no final do século X, e com Gonçalo Mendes, os condes portugueses passariam a ostentar o título de duques. Isto implicou um reforço da influência dos Duques junto da monarquia de Leão, tendo mesmo um dos Duques portugueses sido regente do reino entre 999 e 1008. O território do condado portucalense haveria de ser novamente integrado no Reino da Galiza em 1071. Só voltaria a reemergir após 1093, pela mão de Henrique de Borgonha, após a oferta do condado pela mão do Rei Afonso VI de Leão, pelo auxílio concedido na reconquista das terras aos mouros, tendo também recebido como dote a mão da sua filha, a infanta D. Teresa de Leão. O agora conde D. Henrique introduziu-se ambiciosamente na política do Reino de Leão, conquistando algum poder junto das cortes. Sendo subordinado do Rei, o conde tinha amplos poderes administrativos, judiciais e militares, e o seu pensamento seria progressivamente orientado para a obtenção da completa autonomia. Assim, a fim de aumentar a população e valorizar o seu território, D. Henrique atribuiu diversos forais, e atraiu para Guimarães, com várias regalias, muitos compatriotas seus. Fixada residência em Guimarães, assim se manteria por mais algum tempo a influência de D. Henrique e o seu jogo de poder. Com o seu falecimento, em 1112, passou a viúva deste, Teresa de Leão, a governar o condado até que o seu filho Afonso Henriques atingisse a idade adulta. D. Teresa envolve-se a certa altura com Fernão Peres de Trava, fidalgo galego, a quem entregou a governação dos distritos do Porto e Coimbra, o que despertou um sentimento de revolta entre os Portucalenses e do seu próprio filho, que sendo afastados da gestão do condado, geraram um escalar de tensão crescente. Em 1120, com a influência do clero nacional, nomeadamente o arcebispo de Braga D. Paio Mendes, Afonso Henriques decide tomar uma posição política oposta à mãe, passando a apoiar os independentistas. A tensão crescia, e o arcebispo foi obrigado a deixar o condado, levando consigo o infante Afonso Henriques. É então que aos catorze anos de idade, Afonso Henriques arma-se a si próprio cavaleiro, seguindo o próprio costume dos reis, e torna-se um guerreiro independente (1125). Afonso regressa ao condado mas recusa-se a prestar vassalagem a Afonso VII de Leão e Castela, forçando este último a invadir o Condado Portucalense em 1127. É então que Egas Moniz, aio do jovem Afonso, promete a lealdade do mesmo ao Rei Afonso VII, fazendo este desistir da ideia de conquistar a cidade de Guimarães. Mas alguns meses depois, a 24 de junho de 1128, Afonso Henriques trava a Batalha de São Mamede (em Guimarães), onde defronta a sua própria mãe e as tropas do Conde galego Fernão Peres de Trava. Com a vitória, Afonso Henriques torna-se conde, e D. Teresa e Fernão Peres abandonam o governo do condado, algo que desagradou ao Bispo de Santiago de Compostela que cobiçava o domínio das terras. Sentindo a tensão que esta situação estaria a produzir, D. Afonso Henriques decide concentrar esforços em obter rapidamente o reconhecimento do condado como Reino. É assim que a 25 de julho de 1139, D. Afonso Henriques vence a batalha de Ourique e proclama-se Rei de Portugal. A Batalha nem estava prevista, e aconteceu supostamente devido a uma incursão que os cristãos fizeram nas terras povoadas de mouros, para apreenderem gado, escravos e outros bens. Inesperadamente, um exército mouro em muito maior número saiu ao encontro das forças lideradas por D. Afonso Henriques. Mas apesar da inferioridade numérica, D. Afonso Henriques conseguiu vencer, o que contra todas as hipóteses fez com que as tropas ainda no campo de batalha o aclamassem como rei. A independência de Portugal seria reconhecida apenas em Zamora, a 5 de outubro de 1143, quando o rei D. Afonso VII e o seu primo D. Afonso Henriques assinariam um tratado que viria reconhecer o futuro primeiro Rei de Portugal. Este Tratado foi conseguido em certa medida pela ação desenvolvida pelo novo arcebispo de Braga, D. João Peculiar, que procurou conciliar ambos os primos e fez com que ambos se encontrassem em Zamora nos dias 4 e 5 de outubro de 1143, na presença do cardeal Guido de Vico, emissário do Papa Inocêncio II. D. Afonso VII continuaria a considerar que Afonso Henriques seria seu vassalo, pois era seu desejo continuar a ostentar o título de imperador de toda a Hispânia, e para isso necessitaria de ter reis como vassalos. Mas o novo monarca português acabou por comprometer-se em ser vassalo da Santa Sé, obrigando-se a si e aos seus descentes a um pagamento anual, e fundando diversos conventos para agradar à Santa Sé e ao clero. Afonso Henriques, na sequência, escreve ao Papa Inocêncio II, reclamando o estatuto de “Censual”, ou seja, a dependência apenas da vontade de Roma, algo que seria suficiente, na altura, para o efetivo reconhecimento de Portugal como nação independente (dado que nenhum vassalo poderia ter dois senhores diretos, ficando o Rei de Portugal a prestar vassalagem direta à Santa Sé). Afonso também procurava a plena autonomia para a Igreja portuguesa, e para esse efeito, Afonso Henriques invocaria ao Papa o “milagre de Ourique”, onde supostamente teria recebido uma visão, em que pela graça de Deus os portugueses estariam aptos para vencerem os infiéis. É o Papa Alexandre III, através da bula Manifestis Probatum, que acabaria por reconhecer a independência do país em 1179, talvez fruto do poder de persuasão de Afonso Henriques. Mas como isto aconteceria quase 40 anos depois da assinatura do Tratado de Zamora, Afonso Henriques optou por não perder tempo e avançou para a conquista de mais território de modo a expandir o seu futuro reino. Leiria é conquistada definitivamente em 1145. Santarém é tomada por completo dois anos depois. E é já em 1147, que Afonso Henriques conquistou Lisboa, com o apoio de cruzados do norte da Europa, cruzados esses que participariam na Segunda Cruzada Cristã (convocada pelo Papa Eugénio III), e que auxiliaram no único sucesso dessa campanha. Os primeiros contingentes de cruzados saíram de Inglaterra a 19 de maio, e participavam nesta missão flamengos, normandos, ingleses e escoceses, principalmente. A armada de cruzados chegou ao Porto a 16 de junho, e foi o Bispo do Porto que convenceu os cruzados a juntarem-se à operação militar conduzida por Afonso Henriques, mais uma vez mostrando a grande influência que o clero nacional exercia não só junto do Rei mas também junto do Papa e das decisões que ditariam o futuro do Reino. Afonso Henriques que antes de conquistar Lisboa conquistou Santarém, seguiu por terra rumo a Lisboa, enquanto os cruzados penetraram a foz do Rio Tejo por barco. A conquista de Lisboa seria decisiva para consolidar a linha do Tejo e garantir a independência de Portugal, afastando os receios das forças de Leão poderem voltar a atacar, já que o domínio do Vale do Tejo garantia o acesso a terrenos férteis e à autossuficiência de Portugal. A primeira batalha terá ocorrido em Sacavém onde as forças de Afonso Henriques, em menor número, enfrentaram um primeiro exército de cinco mil muçulmanos. As forças de Afonso Henriques terão conseguido tirar a vida a cerca de três mil muçulmanos, numa batalha que contra todas as probabilidades deu a vitória aos cristãos, pois o seu número de mil e quinhentos homens era bastante inferior ao do adversário. A miraculosa vitória foi, na altura, atribuída à intervenção da Virgem Maria, pois teria contribuído com a chegada dos cruzados que ajudaram no combate contra os mouros. Terminada a sangrenta batalha, ambas as forças, portugueses e cruzados, atacaram a Oeste da colina sobre a qual se ergue hoje a Baixa Lisboeta, e tanto esta colina como a colina a leste seriam rapidamente dominadas pelos cristãos. As forças cristãs tiveram grandes dificuldades em penetrar as muralhas de Lisboa, conseguindo apenas o feito em outubro, quando os cristãos conseguiram abrir uma brecha na muralha e conseguiriam penetrar. As forças muçulmanas, já muito desgastadas pela fome e pelas doenças acabariam por capitular a 20 de outubro. Alguns dos cruzados acabariam por estabelecer-se em Lisboa, entre os quais o futuro Bispo da cidade, Gilbert de Hastings. Internamente, o reino foi sendo pacificado, ao mesmo tempo que as fronteiras eram expandidas até ao Alentejo, mais que duplicando o tamanho original do condado portucalense. Afonso conquista Almada e Palmela também em 1147, Alcácer em 1160 e depois quase todo o Alentejo. De 1166 a 1168, Afonso Henriques conquista inclusivamente várias cidades pertencentes ao Reino de Leão. Fernando II de Leão encontrava-se a repovoar Ciudad Rodrigo, e Afonso Henriques, suspeitando que o seu genro se preparava para o atacar, decidiu enviar um exército comandado pelo seu filho, o infante D. Sancho. Fernando II sabendo da iniciativa foi em auxílio da cidade ameaçada e derrotou as tropas portuguesas, fazendo um grande número de prisioneiros. Em resposta, Afonso Henriques invadiu a Galiza e tomou Tui, em 1169 atacou Cáceres e depois voltou-se contra Badajoz, que na altura, embora controlada pelos muçulmanos, já pertencia à coroa de Leão por um acordo entre estes e o reino de Castela. Fernando II de Leão deixou que os portugueses cercassem os mouros para depois os atacarem e recuperarem a cidade para Leão. Afonso Henriques terá sido ferido pelo exército de Leão, e feito prisioneiro, obrigando mais tarde à assinatura do tratado de paz de Pontevedra, em virtude do qual Afonso Henriques seria libertado com a condição do Reino de Portugal devolver ao Reino de Leão várias cidades como Cáceres, Trujillo, Santa Cruz entre outras. Com o Tratado de Pontevedra, estabeleciam-se assim, as fronteiras de Portugal com Leão e Galiza. Este acordo foi de especial importância, porque mais tarde, quando os muçulmanos irromperam novamente contra Santarém, o exército de Leão ajudou o português na luta contra os mouros. O incidente de Badajoz resultou praticamente no fim da carreira militar de Afonso Henriques. A partir daí, o Rei dedicou-se à administração dos seus territórios com a regência em simultâneo do seu filho D. Sancho. Procurou fixar a população, promoveu a constituição de municípios e concedeu vários forais. Contou com a ajuda das ordens religiosas para o desenvolvimento da economia nacional, predominantemente agrícola na altura. Afonso Henriques deixou um legado importante para o país: fundou a nossa nacionalidade, tendo a mesma sido reconhecida não só pelo papado mas também por vários reinos da Europa; conseguiu estabelecer fronteiras com Leão e Galiza, enquanto pacificou o reino e alargou as fronteiras até sul; apoiou as ordens religiosas e fundou diversos mosteiros e conventos (em particular, o Mosteiro de Santa Cruz em Coimbra, onde ele e o seu filho estão sepultados); optou pela boa relação com os judeus, tendo nomeado o grão-rabino Yahia Ben Yahia para seu Ministro das Finanças, responsável pela coleta de impostos no Reino de Portugal. Esta escolha marcou a tradição de escolher judeus para a área da administração financeira em Portugal, e serviu também para conseguir manter uma boa relação com as comunidades judaicas, boa relação essa que se manteve nos futuros reinados. D. Afonso Henriques viveu uns impressionantes 76 anos, conquistou grande parte do atual território continental português, e as suas proezas foram de tal forma épicas, que ficou conhecido como o Rei “Conquistador”. Faleceu a 6 de dezembro de 1185 e deixou o seu filho, D. Sancho I, no trono do seu Portugal.

Principais pontos a destacar na governação de D. Afonso Henriques:
• Funda a nacionalidade portuguesa, conseguindo o reconhecimento da Santa Sé para a sua causa e a paz com os reinos vizinhos;
• Expande o seu território o mais a sul possível, conquistando várias posições no Alentejo às forças muçulmanas;
• Cria vários municípios por todo o país e funda diversos mosteiros e conventos;
• Promove as relações com os judeus e escolhe-os para administrar as finanças do reino.

D. Sancho I "O Povoador" (1185 – 1211)

D. Sancho I
D. Sancho I foi o quarto filho de Afonso Henriques.
Foi batizado com o nome de Martinho pois o seu nascimento ocorreu a 11 de novembro de 1154, dia do Santo com esse nome. No entanto, o seu irmão mais velho, D. Henrique, viria a falecer ainda muito novo, alterando a ordem de sucessão e também o seu nome, passando a chamar-se Sancho Afonso. Com 16 anos, em 1170, é armado cavaleiro pelo seu pai Afonso Henriques após o acidente de Badajoz, tornando-se assim o braço direito do Rei, tanto na área militar como administrativa. Como Portugal mantinha uma relação tensa com os Reinos de Castela e Leão, e como a Igreja Católica demorava em consagrar a independência de Portugal, D. Afonso Henriques procurou aliados dentro da Península Ibérica, tendo encontrado no Reino de Aragão, inimigo de longa data do Reino de Castela, o reconhecimento que procurava para a sua independência (o Reino de Aragão foi assim o primeiro Reino a reconhecer Portugal como país independente). A aliança entre Portugal e Aragão foi firmada em 1174, com o casamento entre Sancho e a infanta Dulce, irmã mais nova do rei Afonso II de Aragão. D. Sancho, ainda antes de se tornar rei, em 1178, decide atuar preventivamente contra os mouros, confrontando-os junto a Sevilha, para os impedir de entrar novamente em território português. Com a vitória conseguida, D. Sancho consolida a sua liderança junto do exército português, ganhando o seu respeito e admiração. A vitória encheu de orgulho o seu pai Afonso Henriques mas irritou profundamente os muçulmanos, dado que Sevilha era a cidade mais rica e importante da Península Ibérica. Os muçulmanos prometeram vingança e em 1184 atacariam Santarém. D. Sancho, temendo novas investidas, procurou apoio junto das ordens religiosas militares, tal como seu pai já havia antes feito. Com a morte de Afonso Henriques, a 9 de dezembro de 1185, D. Sancho I torna-se o segundo rei de Portugal, tendo sido coroado na Sé de Coimbra, capital do Reino de Portugal. Uma das primeiras grandes decisões de D. Sancho I foi o de findar as guerras junto à fronteira com a Galiza e dedicar-se às guerras a sul. Esta decisão consolidou a fronteira norte de Portugal e permitiu a expansão do território português para sul. Aproveitando a passagem pelo porto de Lisboa dos cruzados da terceira cruzada, em 1189, conquistou Silves, na altura um dos mais importantes centros económicos do Sul, com uma população estimada em torno das 20 mil pessoas. Sancho I ordena então a fortificação da cidade e construiu um castelo que ainda hoje é um dos marcos de Silves. Esta conquista ficou marcada pela sua efemeridade, dado que no ano seguinte o exército muçulmano haveria de atacar novamente a cidade conseguindo capturá-la. A contra-ofensiva muçulmana foi impelida pela conquista de 1189 de Sancho I, e resultou em perdas avultadas para Portugal: grande parte do Alentejo foi perdido, tendo o exército muçulmano chegado até à margem esquerda do rio Tejo, ficando apenas a cidade de Évora em poder dos cristãos. Entre 1190 e 1191, o exército muçulmano de Abu Yusuf Ya’qub al-Mansur, o terceiro califa do Califado Almáda de Marrocos (tendo subido ao trono do império em 1184), tomou as cidades de Alcácer do Sal, Palmela, Almada, Torres Novas e Abrantes. Tomar, que foi cercada, foi defendida ferozmente pelos cavaleiros templários de Gualdim Pais que ao resistir conseguiram travar a invasão. Só em 1195, seria firmada novamente a paz entre o Reino de Portugal e este Califado, concentrando-se o califado na guerra contra o Reino de Castela. Sancho I optou então por dedicar grande parte do seu esforço à organização e administração do seu reino. Conseguiu acumular o tesouro real, incentivou a criação de indústrias, e estimulou a classe média de comerciantes e mercadores. Sancho I concedeu várias cartas de foral a cidades como Gouveia, Covilhã, Viseu, Bragança e Guarda, criando novos concelhos e contribuindo para a povoação de áreas remotas do reino, em particular com imigrantes da Flandres e Borgonha. Ao todo, Sancho I concedeu dezenas de cartas de foral (há relatos que referem terem sido 58 cartas ao todo), e fixando nalgumas delas isenção de impostos, terras para cultivo e perdão de crimes para quem se fixasse junto à fronteira. Sancho I ficaria também recordado pelo seu gosto com as artes e a literatura, tendo elaborado vários volumes com poemas e incentivado a frequência de portugueses nas universidades estrangeiras. Os seus anos de reinado acabariam por não ser tão extensos como os de seu pai, tendo falecido em 1211, completando cerca de 26 anos de reinado.

Principais pontos a destacar na governação de D. Sancho I:
• Consolida as frentes de ataque lusitanas, optando por concentrar as suas forças a Sul, em vez de a norte;
• Derrota os muçulmanos em Sevilha, e conquista Silves, mas essa conquista inflama o sentimento muçulmano contra Portugal, e seguem-se uma série de derrotas e perdas territoriais no sul do país;
• Sancho I opta por reforçar as condições económicas de Portugal, incentiva a criação de indústrias, concede diversas cartas de foral criando novos concelhos e formula políticas para povoamento do território nacional.

D. Afonso II "O Gordo" (1211 – 1223)

D. Afonso II

Afonso II sucederia ao seu pai a 26 de março de 1211, em Coimbra. Nascido a 23 de abril de 1185, ano da morte do seu avô Afonso Henriques, Afonso II enfrentou um reinado bastante curto de apenas 12 anos. Ao invés dos seus antecessores, Afonso II preferiu ser menos belicista: acabou por não contestar as suas fronteiras com Galiza e Leão, nem procurou a expansão para Sul. As conquistas que ocorreram no seu reinado, nomeadamente a posse das cidades de Alcácer do Sal, Borba, Vila Viçosa e outras apenas aconteceram por iniciativa de um grupo de nobres liderados pelo Bispo de Lisboa. Afonso II deu sempre prioridade, na sua governação, à consolidação da estrutura económica e social do país, tendo também procurado estabelecer tratados comerciais com diversos países. Os primeiros 5 anos do seu reinado seriam também caracterizados por violentos conflitos internos contra as suas irmãs Teresa, Sancha e Mafalda, a quem Sancho I deixara em testamento alguns castelos e respetivas vilas no centro do país: Montemor-o-Velho, Seia e Alenquer. Este conflito entre irmãos só viria a ser resolvido por intermédio do Papa Inocêncio III, tendo indemnizado as infantas com dinheiro e entregue a guarnição dos castelos a cavaleiros templários, ficando a coroa, neste caso o Rei Afonso II, a exercer funções soberanas sobre estas terras. Do ponto de vista militar, o maior contributo que Afonso II deixaria como legado para o seu país acabaria por ser a decisão de enviar tropas portuguesas para lutar com as forças castelhanas, aragonesas e francesas contra os muçulmanos na batalha de Navas de Tolosa. Esta batalha ocorreu a 16 de julho de 1212, perto de Navas de Tolosa, em Espanha, e juntou também, na coligação liderada por Afonso VIII de Castela, cavaleiros do Reino de Leão e as ordens militares de Santiago, Calatrava, Templários e Hospitalários. Os cristãos seriam cerca de 100 mil homens e os muçulmanos cerca de meio milhão. Os cristãos, mesmo em menor número, conseguiram sair vitoriosos da batalha e quebrar com o domínio muçulmano na Península Ibérica. Afonso II que ao enviar homens para a frente desta batalha, ficou praticamente sem exército em Portugal, viu o norte do país ser invadido por forças do Reino de Leão a pedido da sua irmã D. Teresa. Afonso II assistiu ainda a uma derrota num combate em Valdevez, quando os seus poucos homens tentaram defrontar as forças de Leão e os cavaleiros de D. Teresa. Impossibilitado de prestar defesa ou resistência às tropas de Leão, o seu reinado apenas seria salvo pelo facto de ter apoiado o exército de Afonso VIII de Castela contra os muçulmanos, e no seguimento da vitória, o seu exército ter regressado a Portugal. Afonso VIII de Castela havia também conseguido que o Papa declarasse esta batalha contra os muçulmanos uma cruzada, o que impediu, sob pena de excomunhão, que o Reino de Leão atacasse quer Portugal quer Castela. As tropas de Afonso IX de Leão regressaram assim ao seu reino, abandonando por completo os interesses de D. Teresa e fragilizando as pretensões das infantas ao trono português. Foi no reinado de Afonso II que foram criadas as primeiras leis escritas (nomeadamente sobre propriedade privada, direito civil e cunhagem de moeda) e pela primeira vez reunidas cortes com representantes do clero e nobreza. Em 1220 o Rei instituiu as inquirições, inquéritos realizados por funcionários régios com vista a especificar a situação jurídica das propriedades do reino. O seu reinado acabaria por ficar marcado por um combate constante contra as classes privilegiadas, isto porque seu pai e avô concederam grandes privilégios ao clero e nobreza e Afonso II preferia ver o poder real ser fortalecido. A título de exemplo, Afonso II tentou combater os privilégios ao clero que o seu avô Afonso Henriques havia implementado, com vista à obtenção da independência de Portugal, pois esses privilégios começaram a tornar-se um grande peso para o país. Afonso II procurou então aplicar parte das receitas das igrejas em propósitos de utilidade nacional, o que provocou um conflito diplomático entre Portugal e o Papado. Afonso II foi mesmo excomungado pelo Papa Honório III, tendo morrido em 1223, ou de lepra ou da excessiva obesidade que caracterizava o Rei.


Principais pontos a destacar na governação de D. Afonso II:
• Participa na Batalha de Navas de Tolosa, ao lado do Rei de Castela, tendo conseguido uma importante vitória face aos muçulmanos;
• Vive em conflito com as suas irmãs, tendo estas tentado conquistar o trono com a ajuda do Reino de Leão;
• Procurou estabelecer diversos tratados comerciais com países estrangeiros para fortalecer as condições económicas do reino;
• Cria as primeiras leis escritas sobre a propriedade privada, direito civil e moeda;
• Reúne as primeiras cortes com representantes do clero e da nobreza;
• Combate as classes privilegiadas para fortalecer o poder do Rei.

D. Sancho II "O Capelo" (1223 – 1248)

D. Sancho II
Sancho II nasceu em Coimbra, em 8 de setembro de 1209. Em 1222, seu pai Afonso II já revelava graves problemas de doença, e com a sua morte, na primavera de 1223, Sancho II acaba por assumir a coroa com provavelmente apenas 13 anos de idade. O reino português atravessava uma profunda crise económica, em virtude das más colheitas agrícolas e das pilhagens sucessivas, dado que Portugal ainda enfrentava períodos de guerra. Além do mais, o seu pai, Afonso II, fora excomungado pelo Papa Honório III. E Sancho II, sendo menor de idade, não poderia governar, ficando um conjunto de nobres comandar os destinos do reino durante os primeiros anos. Sancho II aproveitou então para firmar a paz com D. Estêvão Soares da Silva, Arcebispo de Braga, e um dos mais poderosos senhores de toda a península ibérica, sendo na altura o bispo mais importante de Portugal. Os conflitos com D. Estêvão iniciaram no reinado de Afonso II, visando quebrar a influência do arcebispo a norte, onde D. Afonso II menos controlava o país, com amplos benefícios concedidos ao clero, como por exemplo, diversas isenções fiscais. D. Afonso II iniciou uma violenta disputa que envolveria a destruição dos bens do arcebispo, forçando este ao exílio. Esta disputa conduziria mais tarde à excomunhão do rei. O Papa Honório III chegou mesmo a pedir ajuda ao rei de Leão, Afonso IX, para que auxiliasse o arcebispo e ameaçou Afonso II de invalidar o reino de Portugal, tornando-o desta forma vulnerável a invasões e conquistas de outros reis católicos. Só a assinatura da concórdia com a Igreja, no reinado de Sancho II, permitira alcançar alguma paz no reino de Portugal. Após a relação com a Igreja estar normalizada, Sancho II dedicou-se à governação dos assuntos gerais do reino, concedendo diversos forais e relançando a reconquista portuguesa. Como o Rei não era tido como um grande líder militar, a reconquista neste período haveria de ser principalmente impulsionada pelo Papa Gregório IX, que concederia a Sancho II, ao contrário do que aconteceu com seu pai, um mandato especial para que não fosse possível a sua excomungação a não ser diretamente pela Santa Sé, desde que o Rei persistisse na guerra contra os muçulmanos. De facto, seriam as Ordens Militares, como a de Santiago, que impulsionariam a reconquista, tendo estas recebido o direito a diversas povoações como Aljustrel, Mértola, Sesimbra e Tavira, deixando Sancho II cada vez mais dependente das Ordens Militares. Em 1234 e 1241 foram emitidas bulas papais de Cruzada para o reino de Portugal, e as Ordens Militares viriam também a gozar de mais privilégios como a doação de terras e castelos para o povoamento de zonas mais desertas. Neste período, praticamente todo o Alentejo seria conquistado. Após algumas conquistas militares, Sancho II decidiria trocar de conselheiros do reino, uma troca que se revelaria fatal para os destinos do seu reinado, tendo o reino enfrentado então um período de anarquia, opondo o clero à nobreza. Neste período, tanto os bispos do Porto e de Lisboa acusariam D. Sancho II de ser incapaz de travar os conflitos entre o clero e a nobreza e de defender os interesses da Igreja, pelo que o Papa seria obrigado a intervir, com a emissão de uma bula que favorecia a restauração da força do poder do Rei, por uma nova figura capaz de comandar os destinos de Portugal. Essa figura seria D. Afonso, príncipe de Portugal, e futuro D. Afonso III, que à época vivia em Bolonha. D. Afonso chegaria a jurar, mais tarde, que salvaguardaria e defenderia todos os privilégios concedidos a todos os agentes do reino, levando a que Portugal entrasse em breve num período de guerra civil, com a chegada de Afonso a Lisboa em 1245. Antes, D. Sancho II acabaria por se casar (em 1241 ou 1242) com Mécia Lopes de Haro, nascida no seio de uma família nobre de Leão e Castela, sendo a sua mãe bastarda de Afonso IX de Leão. Este seria o segundo casamento de D. Mécia, e além disso um casamento não autorizado pelo Papa, algo que contribuiu rapidamente para a mesma ser rejeitada pela nobreza, clero e pelo povo português. Por um lado, porque D. Mécia não traria nenhum benefício ou interesse direto à Coroa Portuguesa (afinal, era apenas descendente de uma família nobre, e não da família real), para além de ter insistido em rodear-se de aias e criados castelhanos. O clero português surgiu assim interessado em acelerar a queda do Rei, e começaria a planear com D. Afonso, irmão de D. Sancho II, a queda do Rei. O facto de D. Mécia não conseguir dar herdeiros ao Rei, foi um dos pretextos utilizados para que o matrimónio fosse anulado prontamente. Em representação papal, em 1245, D. Afonso, irmão mais novo do Rei, denuncia o casamento do seu irmão. D. Sancho II que aceitaria tornar inválido o seu matrimónio, ainda assistiria, no Verão de 1245 à publicação de duas bulas, a primeira dirigida aos barões do reino e a segunda aos prelados, decretando unanimemente a deposição do Rei. O reinado entra numa espécie de guerra civil, e D. Afonso, em 1246, toma Santarém, Alenquer, Leiria, Tomar e outras cidades da zona. Sancho II fortifica-se em Coimbra. Covilhã e Guarda são as próximas cidades a cair. Sancho II tomou a iniciativa de procurar o auxílio de Castela, o que levaria à mobilização dos castelhanos para invadir Portugal em dezembro de 1246 e em janeiro do ano seguinte para defrontar os exércitos de D. Afonso. Mas sob pressão da Santa Sé, e após decisão do Papa Inocêncio IV em excomungar D. Sancho II, Afonso de Castela decidiria retirar este de Portugal, acabando assim com o período de guerra civil no país e entregando o poder a D. Afonso. D. Sancho II, constrangido, viu-se obrigado a exilar. A morte do Rei aconteceria em 1248 em Toledo, onde Sancho II se exilaria frustrado e humilhado pelos acontecimentos ocorridos em Portugal. A crise de 1245 mostrou-se fatal para Sancho II, mas permitiria abrir um novo capítulo na história portuguesa.

Principais pontos a destacar na governação de D. Sancho II:
• Opta por firmar a paz com a Santa Sé e o Arcebispado de Braga;
• Atribui diversos forais e conquista o Alentejo;
• A reconquista é impulsionada pelas Ordens Militares recebendo estas vários privilégios em troca;
• O seu casamento com D. Mécia inicia uma guerra civil entre D. Sancho e o seu irmão D. Afonso, que terminaria com a vitória deste último.

D. Afonso III "O Bolonhês" (1248 – 1279)

D. Afonso III
Afonso, sendo o irmão mais novo de Sancho II, não poderia herdar naturalmente o trono. Por isso, cedo foi viver para França, onde em 1235 casou com Matilde II de Bolonha, chegando a combater em nome do Rei Luís IX de França. Mas com o intensificar da crise entre o seu irmão e a Igreja, e com a Bula de 1246 do Papa Inocêncio IV, para excomungar o Rei de Portugal, Afonso recebe aconselhamento da parte da Santa Sé para centrar a sua ação na Península Ibérica, na altura Hispânia, para aí travar guerra contra o Islão. É então que a 24 de julho a Bula Grandi non immerito depõe oficialmente Sancho II do governo do reino de Portugal e Afonso torna-se regente e defensor do reino. Ainda em França, D. Afonso promete através do “Juramento de Paris” guardar todos os privilégios e costumes tanto do clero como da nobreza em Portugal. Afonso abdicou das suas terras francesas e marchou para Portugal, chegando a Lisboa nos últimos dias do ano de 1245, onde inicia um período de guerra civil, opondo os dois irmãos. D. Afonso só viria a coroar-se em 1248, após a morte de Sancho II. Dado que inicialmente D. Sancho II havia sido apoiado pelas forças castelhanas, tornou-se um imperativo que D. Afonso III firmasse rapidamente a paz com Castela. D. Afonso III procura firmar novo casamento mas desta vez com D. Beatriz de Castela, filha ilegítima de Afonso X, para conseguir promover a paz e estabilidade diplomática entre os dois Reinos vizinhos. Mas para que tal fosse possível, Afonso III teria de repudiar a sua primeira mulher, Matilde, evocando ao Papa razões de esterilidade para garantir a dissolução do casamento. D. Matilde acabaria também por reagir e procurou defender-se junto da Igreja, tendo mesmo o Papa Alexandre IV chegado a responder a uma queixa de D. Matilde, ordenando ao rei D. Afonso que abandonasse D. Beatriz. Mas como hábil estratega que era, D. Afonso III procurou ganhar tempo suficiente para resolver este problema da melhor forma, até que em 1258 D. Matilde acabaria por falecer, ficando o problema resolvido de forma natural e assegurando a legitimação do infante D. Dinis, nascido anos antes e fruto da relação com D. Beatriz. O casamento consomado com D. Beatriz beneficiou o Reino de Portugal, pois aquando da morte de Afonso X de Castela, Portugal acabaria por receber alguns territórios a Este do Rio Guadiana, nomeadamente as vilas de Moura, Serpa e Mourão, entre outros. Esta seria uma entre muitas outras decisões que garantiriam a Afonso III o serenar dos ânimos em Portugal, e promover o regresso a um ambiente de relativa paz e harmonia, num reino ainda muito recente mas envolvido em bastantes quezílias internas e emergindo inclusivamente de um período curto de guerra civil. Afonso III decidiu, por isso, não cometer alguns erros do seu irmão e dar mais ouvidos ao seu povo, dando especial destaque à classe dos pequenos mercadores e proprietários, ouvindo ativamente as suas queixas. E é Afonso III que em 1254, em Leiria, convoca pela primeira vez as Cortes, a assembleia geral do reino, com representantes de toda a sociedade, inclusivamente, e pela primeira vez, representantes dos concelhos. Em 1261, as cortes de Coimbra também se revelariam importantes, pois nessas cortes ficaria reconhecido o direito do Rei em cunhar moeda. Em 1258, Afonso III ordenou as Inquirições Gerais, um processo que lhe permitiu controlar o poder da Nobreza e saber qual o estado dos bens que pertenciam por direito à Coroa (apesar das primeiras terem sido ordenadas em 1220). As Inquirições Gerais permitiram a compilação de muitas informações valiosas sobre o reino e a história medieval portuguesa. D. Afonso III também preparou legislação que impedia que as classes mais abastadas cometessem abusos sobre a população mais desfavorecida, mas também concederia inúmeros privilégios à Igreja. Afonso III foi também muito progressista na reforma do Estado Português, podendo mesmo ser considerado o pai do Estado Português, ou da Administração Portuguesa, porque é dele a distribuição de alcaides por castelos e de juízes pelas diferentes terras, com o objetivo de implantar um poder legal ao qual todos os habitantes do reino poderiam aceder a uma relação de igualdade entre si. Organizou a administração pública, fundou várias vilas e concedeu privilégios de cidade através de várias cartas de foral. Uma outra decisão que marcaria Portugal seria a decisão da passagem da capital do país de Coimbra para Lisboa. Esta decisão foi tomada em 1255, e marcaria a vida do país até hoje. A escolha de Lisboa recaiu pela necessidade de aproximar o Rei ao sul do país, onde a Reconquista havia deixado as suas marcas. Portugal era à data uma nação com duas realidades bastante vincadas: um norte mais desenvolvido, com a nobreza implementada e o sul ainda despovoado, sobretudo dominado pelos poderes régios e pelas ordens militares. Afonso III foi também o Rei que conseguiu incorporar com sucesso o Algarve no Reino de Portugal, território que até então pertencia ainda às comunidades muçulmanas, tendo a conquista de Faro ocorrido no ano de 1249. No entanto, este feito iniciou um novo conflito com Castela, dado que esta considerava que o Algarve lhe pertencia. A resolução desta divergência entre os dois reinos apenas teria cobro em 1267, com a assinatura do Tratado de Badajoz a 16 de fevereiro, tratado esse que definiu a fronteira entre os dois reinos marcada pela delimitação do Rio Guadiana. E após a assinatura deste tratado, D. Afonso III evolui a sua titulatura régia para “Pela Graça de Deis, Rei de Portugal e do Algarve”. Afonso III viu-se, já no final da sua vida, envolvido em conflitos com a Igreja, tendo inclusivamente sido excomungado em 1268 pelos bispos de Coimbra e Porto, pelo arcebispo de Braga e pelo Papa Clemente IV. Os conflitos com o clero basearam-se, entre outros, na legislação que o Rei havia produzido sobre o equilíbrio do poder municipal em prejuízo do poder do clero e da nobreza, assim como o impedimento dos bispos em continuar a cobrar os dízimos e o apoio manifestado à nomeação de judeus para cargos de grande importância. O Rei que era altamente popular por entre o povo português, recebeu o apoio das cortes de Santarém em janeiro de 1274, onde foi nomeada uma comissão para realizar um inquérito às acusações que os bispos faziam ao Rei. Esta comissão haveria de absolver o Rei, mas o novo Papa Gregório X não aceitaria o resultado, e ditou a interdição sobre o reino em 1277. Afonso III haveria de falecer em 1279, e antes da sua morte jurou obediência à Igreja e a restituição de tudo o que lhe tinha tirado, atitude que lhe valeu o levantamento da excomunhão pelo abade de Alcobaça, e a garantia de ser nesse mosteiro que haveria de ser sepultado. O seu filho Dinis suceder-lhe-ia como o novo Rei, o sexto nesta dinastia.

Principais pontos a destacar na governação de D. Afonso III:
• Promove a Administração Pública em Portugal, fundou diversas povoações e diminuiu os poderes e regalias da nobreza e do clero;
• Conquista definitivamente o Algarve aos muçulmanos;
• Nomeia Lisboa a capital do seu Reino;
• Convoca as primeiras cortes com representantes de todo o Reino de Portugal;
• Assina o Tratado de Badajoz com Castela, o primeiro grande passo para o reconhecimento oficial das fronteiras de Portugal.

D. Dinis I "O Lavrador" (1279 – 1325)

D. Dinis
D. Dinis I foi o sexto Rei de Portugal e nasceu a 9 de outubro de 1261, vindo a falecer a 7 de janeiro de 1325. Filho de D. Afonso III e de D. Beatriz de Castela, foi aclamado em Lisboa em 1279, quando tinha 17 anos. Revelou-se um Rei bastante determinado e um grande estratega, com uma ação muito proactiva no âmbito do desenvolvimento da política governativa e legislativa. Casar-se-ia com Isabel de Aragão, e durante os 46 anos do seu reinado foi um impulsionador da identidade nacional. Quando subiu ao trono, Portugal encontrava-se em conflito com a Igreja Católica, tendo D. Dinis procurado serenar a situação e assinado um tratado com o papa Nicolau IV, jurando proteger os interesses da Santa Sé em Portugal. O reino encontrava-se também numa situação de fragilidade administrativa, devido à prolongada doença de D. Afonso III, pelo que D. Dinis seria forçado a adotar medidas imediatas que reforçassem o poder da Coroa. Uma das grandes medidas adotadas seria a promoção da libertação das Ordens Militares das influências estrangeiras (na prática, o Rei promoveu a nacionalização das Ordens Militares): primeiro, e após a extinção da Ordem dos Templários por decreto do Papa, o Rei conseguiu autorização do papado para transferir o património desta em Portugal para a nova Ordem de Cristo (uma nova Ordem militar portuguesa, criada propositadamente para o efeito, e que conseguiu manter os privilégios dos Templários e as suas possessões em território português). Segundo, apoiando os cavaleiros portugueses da Ordem de Santiago, ao separarem-se do domínio Castelhano (o Mestre da Ordem de Santiago era residente em Castela, e esta Ordem possuía muitas terras e castelos junto à fronteira). Outra grande decisão do Rei para fortalecer a consolidação administrativa e territorial do reino, seria tomada em 1284, com a ordenação do desenvolvimento e aplicação das inquirições Dionisinas, que se revelaram mais eficazes que as anteriores, e garantindo a regulação dos direitos da nobreza e do clero relativos à possessão de terras e à transmissão de heranças. Assim, o Rei consolidaria a organização do reino como uma das suas grandes prioridades da ação governativa. D. Dinis criaria inúmeros concelhos e atribuiria muitos forais para fomentar o povoamento. O Rei confirmaria também a predileção por Lisboa como local de permanência da corte régia, e desenvolveu-a como centro administrativo por excelência. É neste reinado que Lisboa, e dado o interesse pessoal do Rei pela área da cultura, afirmou-se mesmo como um dos grandes centros literários europeus. O Rei mandou traduzir diversas e importantes obras de literatura, tornando-se o primeiro Rei a promover as artes, a educação e a ciência. D. Dinis instituiu também a primeira Universidade portuguesa, fundada em Lisboa em 1290 e transferida para Coimbra em 1308. Aí se ensinava à data o Direito Civil, o Direito Canónico, as Artes e a Medicina. E é no seu reinado que a língua portuguesa é instituída como a língua oficial da corte, obrigando todos os documentos a serem escritos em português (muitos documentos à data ainda eram redigidos em latim, pelo que esta foi uma decisão de grande impacto para o desenvolvimento da língua portuguesa). D. Dinis preocupou-se também com o desenvolvimento das infraestruturas de Portugal e com o fomento da economia, tendo ordenado a exploração de minas de cobre, prata, estanho e ferro, e organizando a exportação da produção excedente para outros países europeus. É dele a assinatura do primeiro acordo comercial português com a Inglaterra (assinado em 1308), e fomentou as exportações não apenas para Inglaterra mas também para a França e a Flandres. Lançou os pilares para o futuro desenvolvimento da marinha mercante em Portugal com a Carta Régia de 1293, onde consagrava a criação da Associação de Mercadores (mais conhecida pela Bolsa de Mercadores), que promovia a proteção dos mercadores face aos possíveis prejuízos com as suas embarcações no decurso das viagens. Fundou a marinha Portuguesa (criada em 1312), criando também várias docas e nomeado 1º Almirante de Portugal o genovês Manuel Pessanha. O Rei promoveu também a agricultura, fundou várias comunidades rurais, e para desenvolver a atividade mercantil, fundou também diversos mercados e as chamadas feiras francas, onde os comerciantes não pagavam qualquer imposto. Além disso, ganhou o seu cognome “O Lavrador” pela ação de conservação e expansão do Pinhal de Leiria, criado pelo seu pai D. Afonso III, para proteger as terras agrícolas da degradação das dunas e da areia transportada pelo vento, algo que na época constituía uma grande preocupação para a população. Foi um grande dinamizador da organização do terreno agrícola em Portugal, fomentando diversos sistemas de organização da propriedade no território nacional. Apesar da sua governação ser tida como pacífica, Portugal ver-se-ia envolvido num período de guerra com Castela durante dois anos (1295-1297), dada a morte do Rei Afonso X e a subida ao trono de Castela de Sancho IV, um rei que optaria por seguir uma política mais belicista em relação a Portugal, desejando disputar a fronteira junto ao Guadiana. O conflito apenas haveria de ficar sanado em 1297, com a assinatura do Tratado de Alcanizes, firmando as fronteiras de Portugal. Este Tratado previa também uma paz de 40 anos entre ambos os reinos, promovendo não apenas a amizade mas também a defesa mútua. No seguimento deste Tratado, D. Dinis impulsionou a reconstrução de castelos e reorganizou os núcleos militares para garantir a defesa em caso de possíveis invasões castelhanas. A parte final do seu reinado foi marcada por diversos conflitos internos. O futuro Rei D. Afonso IV, e herdeiro de D. Dinis, receava que o pai viesse a favorecer um dos seus filhos bastados, D. Afonso Sanches. Afonso IV haveria de combater o pai, exigindo que este lhe entregasse o trono, dado que em 1322, D. Dinis havia enfrentado uma doença severa (pensa-se que um ataque cardíaco ou um acidente vascular-cerebral), procurado no seguimento da recuperação alterar o seu testamento para entregar o reino à sua Rainha e em segunda prioridade ao seu filho bastardo Afonso Sanches. Um ano depois ficou célebre a Batalha de Alvalade que opôs as forças de D. Dinis às de D. Afonso IV, em 1323, tendo sido apenas evitada por ação da Rainha D. Isabel, que se interpôs no meio de ambas as fileiras de batalha. D. Dinis viria a falecer em Santarém a 7 de janeiro de 1325, e foi sepultado no Mosteiro de São Dinis em Odivelas.

Principais pontos a destacar na governação de D. Dinis I:
• Apazigua as relações com a Igreja Católica e liberta as Ordens Religiosas das influências externas;
• Assina o Tratado de Alcanizes, firmando a paz com Castela e definindo as fronteiras portuguesas;
• Institui a língua portuguesa como a língua oficial da corte e funda a primeira Universidade em Portugal, promovendo as artes, a educação e a ciência;
• Reforça Lisboa como a capital administrativa de Portugal;
• Foca-se no desenvolvimento económico: funda a Marinha Portuguesa, celebra o primeiro acordo comercial com Inglaterra, desenvolve a atividade mercantil e ordena a extração de matérias-primas e desenvolve a agricultura.

D. Afonso IV "O Bravo" (1325-1357)

D. Afonso IV
D. Afonso IV subiria ao trono a 7 de fevereiro de 1325, no seguimento da morte de seu pai, tornando-se o sétimo rei de Portugal. Como referido no capítulo anterior, Afonso IV receava que seu pai D. Dinis legasse a sua sucessão num dos seus filhos bastardos: D. Afonso Sanches. A rivalidade entre Afonso IV e Afonso Sanches originou diversos conflitos internos, pelo que após a coração de Afonso IV, a sua primeira decisão a tomar foi o exílio de seu meio-irmão para Castela. Além do mais, Afonso IV retirou-lhe todos os legados deixados por D. Dinis, levando à revolta novamente de Afonso Sanches que em Castela planeou várias manobras políticas e militares com o fim de invadir Portugal e tornar-se ele próprio rei. As tentativas de invasão saíram falhadas, e ambos os irmãos acabariam por assinar um tratado de paz, sob alçada da Rainha Isabel. O Rei D. Afonso IV era um homem de personalidade forte e austera, que apesar de não ser muito amado pelo povo, era bastante respeitado como Rei. Acabou por legislar leis que viriam a interferir com a vida privada dos portugueses, colocando em causa costumes antigos. Como o país fica de uma guerra civil, e os tumultos populares corriam risco de ressurgir, o Rei optou por reunir as cortes em Évora, para obrigar os representantes do clero e da nobreza a jurarem-lhe lealdade enquanto Rei. Depressa se seguiria mais um outro episódio que reforçaria o carácter de personalidade vincada do Rei. Afonso IV havia casado em 1309 com a infanta Beatriz, filha do rei Sancho IV de Castela, tendo da união resultado 8 filhos, dois dos quais a filha primogénita, D. Maria e o futuro rei D. Pedro I. A sua filha primogénita, D. Maria de Portugal, haveria de ser a causa de uma nova crise com Castela, dado que ao tornar-se esposa de Afonso XI de Castela em 1328, viria a ser maltratada publicamente por este. D. Afonso XI de Castela trairia sua esposa com Leonor de Gusmão, de quem teve vários filhos, causando grande mal-estar entre as duas coroas. D. Afonso IV, tendo conhecimento dos diversos maltratos e humilhações sofridas pela sua filha, resolveu atacar a fronteira de Castela em retaliação. Só em 1339, e fruto da intervenção da própria D. Maria de Portugal, haveria de ser assinado o Tratado de Sevilha, pondo termo à guerra entre os dois reinos. D. Maria de Portugal, recolhida num convento em Sevilha, fora pressionada por seu marido Afonso XI para apelar ao Rei de Portugal, seu pai, a fim de colaborar com Castela numa aliança contra os muçulmanos. Este apelo a uma união entre Portugal e Castela resultou no seguimento da aliança firmada entre o Rei de Fez e de Marrocos, com o emir de Granada, onde ambos decidiram reconquistar os territórios perdidos para os cristãos na Península Ibérica. Castela que havia perdido parte significativa da sua esquadra marítima numa tempestade, ficara com as suas defesas debilitadas face a uma possível ofensiva muçulmana, pelo que Afonso XI haveria de se humilhar e engolindo o seu orgulho ferido acabaria por se dirigir a D. Maria de Portugal, pedindo a intervenção desta junto de seu pai para que o Rei de Portugal pudesse enviar uma esquadra em socorro de Castela. D. Maria acedeu ao pedido, mas Afonso IV de Portugal haveria de responder ao Rei de Castela que se este precisasse de ajuda, que haveria de lhe pedi-la diretamente. Afonso XI assim o fez, enviando diretamente uma carta ao Rei de Portugal, e Afonso IV, que ainda se reuniria pessoalmente com Afonso XI em Évora, acabaria por consentir o envio da frota comandada pelo almirante genovês Manuel Pessanha, para além de reunir em Elvas o maior número possível de cavaleiros e peões. A 30 de outubro de 1340, a aliança entre tropas portuguesas e castelhanas contra os mouros iria provar a sua viabilidade naquela que ficou conhecida como a Batalha do Salado, por ter ocorrido junto à ribeira com o mesmo nome, em Cádis. A 29 de outubro, ambos os Reis de Portugal e Castela, presentes no conselho de guerra, decidiram a tática a adotar: o Rei de Castela combateria o Rei de Marrocos e o Rei de Portugal o emir de Granada. O Rei de Portugal seria acompanhado pelo arcebispo de Braga, o prior do Crato, o mestre da Ordem de Avis e muitos outros cavaleiros pertencentes à nobreza. A batalha iniciaria no dia seguinte, e as tropas portuguesas haveriam de enfrentar muitas dificuldades dado que as tropas de Granada eram mais disciplinadas e organizadas que as de Marrocos, para além de que combatiam com a motivação de defender aquele que ainda era o seu território (Cádis, no sul de Espanha, estava então sob controlo dos muçulmanos). D. Afonso IV e seus cavaleiros, num momento crítico da batalha, conseguiriam romper a formidável barreira inimiga e espalhar a desordem entre o exército muçulmano que bateu em retirada. Do campo de batalha, os Reis cristãos haveriam de retirar valiosíssimos tesouros como ouro e prata, que Afonso XI deu a escolher a Afonso IV de Portugal, em “quantidade e qualidade”, como sinal de agradecimento por toda a ajuda. Esta batalha teve um grande impacto sobre as pretensões muçulmanas na Península Ibérica, pois não apenas desmoralizou por completo os seus objetivos sobre as terras cristãs, como garantiu que Portugal mantivesse a sua própria integridade territorial, afastando de vez as ameaças sobre o seu território. D. Afonso IV revelou-se decisivo na batalha, e como tal ganharia o cognome de “o Bravo” pelos seus feitos em conjunto com a sua cavalaria, garantindo a vitória das forças cristãs. Após esta batalha, o Rei dedica-se durante algum tempo aos assuntos da governação do Reino, mas começam a surgir diversos contratempos e dissabores para o Rei. Em 1343, apenas 3 anos depois da famosa Batalha do Salado, haveria Portugal de enfrentar uma escassez enorme de cereais. Um ano mais tarde, navegadores portugueses haveriam de realizar as primeiras viagens de exploração no oceano atlântico, tendo chegado às Canárias em 1344, ficando para a história o grande contributo de Afonso IV, para a realização das primeiras viagens de exploração marítima e o desenvolvimento da atividade mercantil. No entanto, Castela haveria de conseguir do Papa a atribuição deste domínio territorial, ficando senhora das ilhas Canárias. Em 1347, um sismo abalaria Coimbra causando enormes prejuízos, e mais grave ainda, em 1348 a praga que assolava a Europa chegaria também a Portugal: a peste bubónica (mais conhecida por peste negra). Esta praga foi o problema mais grave que o Rei Afonso IV haveria de enfrentar no seu reinado, pois vitimaria grande parte da população portuguesa causando grande desordem. Estima-se que a praga de peste negra na Europa tenha dizimado cerca de 75 milhões de pessoas durante o século XIV (cerca de metade da população europeia, mas apesar deste número não ser consensual entre muitos investigadores, é o número mais defendido por muitos historiadores). A peste chegaria em Portugal em pleno outono, tendo matado entre um terço a metade da população do país. A sociedade portuguesa vivia um período caótico, e as Cortes convocadas em 1352 viriam finalmente a permitir a restauração da ordem no país. Mas já com o país a recuperar da praga da peste, D. Afonso IV viria a enfrentar novos dias de desassossego. O rei castelhano viria a falecer vítima da peste negra, e o reino vizinho viria a enfrentar uma guerra civil pelos direitos à sucessão, entre D. Pedro I de Castela e seu meio-irmão D. Henrique, levando à presença de um cada vez maior número de refugiados castelhanos em Portugal. Entre esses refugiados ou exilados, encontravam-se vários nobres castelhanos que procuraram criar o seu espaço de influência junto da Corte portuguesa. E mais tarde, com Inês de Castro que era filha do mordomo-mor do rei D. Afonso XI de Castela, ao tornar-se amante do príncipe herdeiro D. Pedro, os nobres castelhanos cresceriam ainda mais em poder junto da Corte portuguesa. Para compreendermos melhor este contexto, importa referir que D. Pedro se haveria de casar com D. Constança Manuel, filha de D. João Manuel de Castela, neto do rei Fernando III de Castela. D. Constança ao vir para Portugal, traria como uma das suas aias Inês de Castro, futura amante e paixão do infante D. Pedro. Ao iniciar-se a relação entre D. Pedro e D. Inês, e dado que nasceram vários filhos desta relação, Afonso IV de Portugal decidiu exilar Inês de Castro no castelo de Albuquerque, junto à fronteira castelhana. Mas após a morte de D. Constança, no seguimento do nascimento do único filho, o futuro Rei D. Fernando, D. Pedro pede a Inês de Castro para regressar do seu exílio, passando ambos a viver juntos. Conta-se que a família de Inês de Castro planeava assassinar o infante D. Fernando, o herdeiro legítimo de D. Pedro para que o trono português ficasse entregue ao filho mais velho de D. Inês. Cada vez mais pressionado pela corte portuguesa, D. Afonso IV decidiu que o melhor a fazer seria executar Inês de Castro. A execução ocorreria no início de 1355, levando à revolta de D. Pedro contra o seu pai, que entraria em guerra, saqueando inclusive a região do norte de Portugal, nomeadamente do Minho. A Rainha D. Beatriz viria a intervir junto de ambos os lados e selando a paz entre pai e filho em agosto de 1355, mas a reconciliação definitiva só chegaria em 1357 com a entrega de grande parte do poder executivo a D. Pedro. D. Afonso IV viria a falecer nesse mesmo ano.

Principais pontos a destacar na governação de D. Afonso IV:
• Promove um ambiente belicista entre si e o seu meio-irmão Afonso Sanches;
• Declara guerra a Castela em virtude das humilhações sofridas pela sua filha;
• Mais tarde, torna-se aliado de Castela para derrotar a ameaça muçulmana na Batalha do Salado;
• É confrontado com a crise dos cereais, enfrentando um povo faminto e assolado pela peste negra;
• Desenvolve a marinha mercante portuguesa e descobre as ilhas Canárias;
• Ordena a execução de Inês de Castro e inicia um conflito com seu filho D. Pedro.

D. Pedro I "O Justiceiro" (1357 - 1367)

D. Pedro I
Pedro I nasceu em Coimbra a 8 de abril de 1320. Não sendo filho primogénito de D. Afonso IV (foi o quarto filho do Rei e da Rainha D. Beatriz), acabaria por suceder ao pai no trono de Portugal, devido à morte precoce dos seus irmãos. Pouco se conhece da sua infância, mas Pedro I era já tido como uma criança de temperamento volátil para além de ser um amante de festas e música. Pedro I envolveu-se ainda antes de ser Rei com a aia de sua mulher Constança Manuel, Inês de Castro, de origem galega. O caso ficou célebre na história portuguesa e marcou decisivamente o seu reinado, tendo este relacionamento com Inês de Castro influenciado fortemente a política interna de Portugal, até pelos motivos já descritos no capítulo anterior. Com a execução de Inês de Castro em 7 de janeiro de 1355, a pedido de Afonso IV, o ainda infante Pedro iria revoltar-se com o apoio da nobreza e dos irmãos de Inês. A paz apenas chegaria alguns meses depois, e em 1357 o infante tornava-se Pedro I, no seguimento da morte de seu pai. Já em junho de 1360, Pedro I anuncia em Cantanhede que ter-se-ia casado com Inês de Castro, para que esta fosse recordada como Rainha. No seguimento deste anúncio, os assassinos de Inês são capturados e executados (Álvaro Gonçalves e Pêro Coelho), de uma forma horrível, tendo a mesma ficado descrita na história como “a um foi arrancado o coração pelo peito, e a outro pelas costas”. Ainda para finalizar este ponto, conta-se que Pedro I terá mandado desenterrar o corpo de Inês de Castro, coroando-a como Rainha e obrigando a nobreza a beijar-lhe as mãos sob pena de morte. O Rei D. Pedro I ordenou então a construção de dois túmulos no Mosteiro de Alcobaça, duas obras-primas da escultura gótica, para que o corpo dele e de Inês de Castro fossem sepultados lado a lado. Concentrado nas tuas tarefas de governação, Pedro I acabaria por reinar durante pouco tempo (apenas 10 anos), mas revelou-se um grande estadista. É dele a aprovação do Beneplácito Régio, um preceito que determinaria que as deliberações da Igreja Católica, destinadas ao clero e fiéis, para serem válidas em Portugal deveriam receber aprovação do Rei. Esta medida provocou uma pequena revolta no clero, que nas cortes de Elvas em 1361 solicitou a revogação do decreto, tendo Pedro I declinado justificando-se que era fundamental para afirmar a força do Estado. Pedro I ficou também conhecido pelas suas decisões na área da justiça. O Rei proibiu, com pena de morte, a prática da advocacia, para que a justiça funcionasse de forma célere e as sentenças não fossem atrasadas de forma alguma e também regulamentou prazos na produção de despachos administrativos e judiciais. O facto de ter defendido o povo e as classes menos favorecidas, aplicando a lei de forma independente e sem discriminações, julgando de igual forma nobres e plebeus, fez com que a nobreza o temesse, enquanto o povo o adorasse. Aliás, tornou-se uma das marcas do seu reinado a ligação ao povo de Portugal, tendo o Rei participado em vários festejos durante os anos da sua governação. No âmbito da política externa, o Rei D. Pedro I optou por instituir relações de neutralidade com os reinos vizinhos. A única situação militar ocorrida no seu reinado resultou na ajuda prestada por D. Pedro I ao seu sobrinho e Rei de Castela na guerra contra o seu meio-irmão. O reinado de Pedro I haveria de ser marcado pela prosperidade financeira do país, tendo o Rei ordenado a cunhagem de ouro e prata. D. Pedro I haveria também de tomar uma decisão que influenciaria o futuro do reino a longo prazo: a entrega da Ordem de Avis a João, futuro rei de Portugal. No entanto, com a morte de D. Pedro I, a 18 de janeiro de 1367, subiria primeiro ao trono o seu filho Fernando. 

Principais pontos a destacar na governação de D. Pedro I:
• Administra a justiça não olhando a quem, promovendo um sistema de igualdade e proibindo com pena de morte a prática da advocacia;
• Rompe com o poder absoluto da Igreja Católica, subvertendo-a à decisão e autoridade do Rei;
• Assiste a um ambiente próspero em Portugal, cunha ouro e prata, e é amado pelo seu povo.

D. Fernando I "O Formoso" (1367 - 1383)

D. Fernando
Fernando I de Portugal tornou-se o nono rei em virtude da morte de seu pai D. Pedro I. D. Fernando nasceu em Coimbra a 31 de outubro de 1345 e viria a falecer em Lisboa a 22 de outubro de 1383, com apenas 37 anos. O reinado de D. Fernando I foi marcado pelas crises de política externa. D. Fernando I era bisneto de D. Sancho IV de Castela, e aquando da morte de D. Pedro I de Castela em 1369, sem quaisquer herdeiros masculinos, Fernando I de Portugal declara-se herdeiro do trono de Castela. Ao trono de Castela declaram-se também como herdeiros os reis de Aragão (Pedro IV), Navarra (Carlos II), o duque de Lancaster (João de Gante, casado com a filha mais velha de D. Pedro de Castela) e D. Henrique, irmão bastardo do falecido rei castelhano. É Henrique que acaba por se tornar Henrique II de Castela, tendo assumido a coroa e sido proclamado rei. Este período haveria de ficar marcado pelas guerras fernandinas, basicamente um conjunto de campanhas militares sem qualquer sucesso para que Fernando I de Portugal fosse ele também Fernando de Castela. A primeira guerra ocorreu no período entre 1369 e 1370, com resultados pouco claros, tendo o Papa Gregório XI intercedido no sentido de mediar a sucessão e colocando em acordo todas as partes. O Tratado de Alcoutim de 1371 permitiu a paz entre Portugal e Castela, delegando o reconhecimento da sucessão em Henrique e D. Fernando tendo direito ao matrimónio com Leonor de Castela, filha de D. Henrique. Mas D. Fernando não levaria o matrimónio por diante, e acabaria por se apaixonar e casar com D. Leonor Teles de Menezes, mulher de um dos seus cortesãos, provocando o descontentamento entre a nobreza portuguesa. A segunda guerra ocorre no período entre 1372 e 1373, onde D. Fernando é convencido pelo Duque de Lancaster para que ambos se aliassem e promovessem a expulsão de Henrique do trono de Castela. Esta segunda guerra revelar-se-ia de pouco êxito e a paz entre Castela e Portugal restabelecer-se-ia em 1373. Neste período, a rainha Leonor tornava-se cada vez mais influente mas as suas manobras de políticas externas levam-na a tornar-se também cada vez mais impopular. D. Fernando não sendo capaz de manter um governo forte, começaria a assistir a uma degradação do ambiente político interno. Após a paz ser firmada com Castela, D. Fernando dedicou-se à administração interna do reino, tendo mandado reparar castelos e ordenado a construção de novas fortificações e novas muralhas em redor de Lisboa e do Porto. Para promover o desenvolvimento da agricultura, promulgou a famosa Lei das Sesmarias, a 28 de maio de 1375. Esta lei foi absolutamente vital para relançar a economia portuguesa e em especial o setor agrícola, dado o particular contexto de crise económica que se manifestava na Europa, com o impacto nas estruturas da sociedade motivado pela peste negra. Como as taxas de óbito eram extremamente elevadas, a mão-de-obra disponível para qualquer tipo de trabalho escasseava, o que provocou um aumento médio dos salários praticados. No entanto, e como a falta de mão-de-obra levou também à consequente diminuição da produção agrícola, o impacto no despovoamento de todo o país fez-se sentir de forma muito severa. A Lei das Sesmarias tinha como grandes objetivos fixar os trabalhadores rurais às terras, obrigar os proprietários a cultivar as terras sob pena de expropriação, fixar os salários dos trabalhadores rurais, obrigar ao trabalho agrícola todos os que fossem filhos ou netos de lavradores, fixar preços de rendas e aumentar o número de trabalhadores rurais pela conversão de mendigos, ociosos ou vadios, entre outros. Esta Lei das Sesmarias pode mesmo ser encarada como uma grande reforma agrária, dado que permitiria converter muitos baldios em terras cultivadas. Outra das orientações expressas do Rei D. Fernando foi para o desenvolvimento das relações mercantis com o estrangeiro. O desenvolvimento da marinha foi muito apoiado, com a autorização de corte de madeiras nas matas reais para a construção de navios e com a isenção total de direitos sobre a importação de ferragens e apetrechos para navios, entre outros. É por D. Fernando que se dá a criação da Companhia das Naus, em 1380, basicamente uma associação mutualista que funcionava como uma companhia de seguros, em que todos os navios tinham de ser registados, pagando uma contribuição dos seus lucros de cada viagem para uma caixa comum. Os fundos seriam depois canalizados para pagar prejuízos de navios que se afundassem ou caso tivessem de sofrer reparações. A constituição da Companhia das Naus revelou-se de grande importância para a expansão ultramarina portuguesa nos séculos seguintes, pois criou um mecanismo económico de comparticipação do investimento, diminuindo de forma assinalável os riscos económicos para os mercadores e financiadores do transporte marítimo. O reinado de D. Fernando I não finalizaria sem, no entanto, ocorrer uma nova crise com Castela. Em 1379, o rei Henrique II de Castela acabaria por falecer, e no seguimento deste evento, o Duque de Lancaster acabaria por reclamar novamente os seus direitos, apelando a Portugal para se aliar nesta nova tentativa de subida ao trono de Castela, algo que em muito contribuiu para o relançamento do clima de tensão com Castela. No entanto, é D. João I de Castela, filho de Henrique II, que acabaria por subir ao trono, e Fernando I, inicialmente aliado do Duque de Lancaster, acabaria por firmar a paz com Castela com o Tratado de Elvas de 1382, onde ficaria estipulado que a herdeira de Fernando, Beatriz, se casaria com o filho do rei João I de Castela. Se o Rei D. Fernando considerava que este tratado seria benéfico para Portugal, pois permitiria ao país firmar uma vantagem na sucessão a um futuro direito pretendente sobre o trono de Castela, na prática o casamento entre D. Beatriz e João I de Castela revelou-se um desastre para as pretensões portuguesas, pois aquando da crise sucessória portuguesa, Beatriz que era a única filha legítima de D. Fernando, conferiu o direito ao Rei D. João I de Castela em procurar a anexação de Portugal. Essa situação aconteceria logo no ano seguinte, com a morte de D. Fernando I, a 22 de outubro de 1383, chegando ao fim a linhagem de Borgonha. D. Leonor Teles de Menezes assumiria a regência de Portugal em nome de Beatriz e abrir-se-ia uma nova crise em Portugal durante o período 1383-1385 (o Interregno), crise essa que seria resolvida com a coroação do meio-irmão de D. Fernando I, D. João, Grão-Mestre da Ordem de Avis.

Principais pontos a destacar na governação de D. Fernando I:
• Declara-se pretendente ao trono de Castela, mas as suas campanhas militares são um fracasso;
• Permite a degradação do ambiente político interno;
• Funda a Companhia das Naus, num esforço para desenvolver a marinha portuguesa;
• Elabora a Lei das Sesmarias, a grande reforma agrária portuguesa até então;
• Com a sua morte, deixa o reino sem sucessão e mergulhado no caos político.

D. João I "O de Boa Memória" (1385 - 1433)

D. João I
D. João nasceu em Lisboa, a 11 de abril de 1357, e foi o décimo Rei de Portugal, sendo o primeiro da dinastia de Avis, filho bastardo do Rei D. Pedro I e meio-irmão de D. Fernando I. Após a morte de D. Fernando, o Rei de Castela, também ele D. João I, achou-se no direito de exigir o trono de Portugal, dado que estava casado com D. Beatriz, a única filha do Rei D. Fernando I. A morte de Fernando I de Portugal permitiu entregar a regência do reino à sua esposa, a Rainha D. Leonor Teles de Menezes. Esta tornou-se extremamente impopular junto da sociedade portuguesa quando ficou a conhecer-se, publicamente, o seu relacionamento amoroso com o nobre galego João Fernandes Andeiro. A sociedade portuguesa dividiu-se então em dois grandes partidos: um a favor de D. Beatriz como Rainha de Portugal, consolidando apoios principalmente junto das classes mais favorecidas e nobres, e outro, chefiado por D. João, Mestre de Aviz, que lutou contra a entrega do trono português a um Rei estrangeiro. O movimento de D. João tornou-se particularmente popular, obtendo o apoio da burguesia e do povo português. O apoio de base popular conferido a D. João, permitiu-lhe ganhar confiança suficiente para lutar sem qualquer complexo pelo trono português. É então que no final de 1383, e estando ciente do descontentamento crescente do povo português, a sua base popular de apoio, o Mestre de Aviz orquestra o assassinato do conde de Andeiro, e com o apoio de diversos fidalgos, consegue obrigar D. Leonor Teles a fugir de Lisboa. Foi este momento que permitiu abrir portas a D. João para ser proclamado regedor e defensor do Reino de Portugal, lançando assim o movimento monárquico na sua segunda dinastia, a de Aviz. No seguimento destes eventos, e já no final de Dezembro de 1383, João I de Castela decidiu invadir Portugal pela Guarda, determinado a cumprir o seu sonho e tornar Castela e Portugal num só reino, unido em torno de uma coroa e de um único Rei. Neste período, estala a guerra civil em Portugal, com várias cidades e vilas a declarar apoio à Rainha D. Leonor Teles, outras a declarar apoio a D. Beatriz, legítima herdeira do Rei D. Fernando e esposa de João I de Castela, e outras ainda ao Mestre de Aviz. Com o apoio dividido em três frentes distintas a lutar pela pretensão ao trono português, D. João I de Castela mantém a sua rota rumo a Lisboa, conseguindo mesmo montar cerco à cidade durante quase um ano, entre fevereiro e outubro de 1384. O cerco acabou por não surtir os efeitos desejados para Castela, dada a determinação dos portugueses em resistir, aliado à boa estrutura defensiva de Lisboa, aos alimentos que conseguiam chegar via Porto e à epidemia de peste negra que assolou as forças castelhanas. Mais ainda, D. Nuno Álvares Pereira, um apoiante do Mestre de Aviz e futuro Condestável de Portugal (segunda mais elevada patente militar no reino, apenas suplantada pelo próprio Rei), viria a revelar-se um general de grande eficácia, conseguindo diversas vitórias em prol do futuro Rei D. João I. Uma dessas vitórias ocorreu na conhecida Batalha dos Atoleiros, disputada a 6 de abril de 1384, junto a Fronteira, no Alentejo. D. Nuno Álvares Pereira tinha sob seu comando cerca de 1.500 homens e enfrentaria as forças castelhanas com cerca de 5.000 homens, dos quais 2.000 eram cavaleiros. O primeiro movimento de ataque pertenceria à cavalaria castelhana, tendo D. Nuno optado por dispor as suas tropas em formato de retângulo, com a maioria dos seus lanceiros na vanguarda. Foram estes que contiveram o primeiro ataque da cavalaria castelhana, causando grandes baixas ao exército inimigo. Após a segunda investida castelhana, já com as forças de infantaria, as linhas defensivas portuguesas atuaram com grande coragem e não permitiram qualquer avanço aos invasores. Aí, as tropas castelhanas desmoralizaram e desorganizaram-se, tendo as forças de D. Nuno iniciado a sua perseguição. A Batalha dos Atoleiros foi a primeira batalha na Península Ibérica a utilizar novas táticas de defesa pelas forças de infantaria em inferioridade numérica contra as forças de cavalaria pesada em maior número. É também de realçar que as forças portuguesas sofreram um número de baixas bastante reduzido (há registos que apontam até para a inexistência de baixas do lado português), o que foi encarado pelos soldados como uma manifestação divida e uma prova em como Deus muito provavelmente apoiaria os portugueses na causa da defesa contra a invasão dos castelhanos. A 6 de abril de 1385, em Coimbra, as Cortes portuguesas aí reunidas proclamam D. João I como Rei de Portugal, num dos primeiros gestos democráticos de eleição de um sucessor de um Rei na Europa. Estando três candidatos a disputar o trono Português – D. João I de Castela, D. João filho de D. Pedro e de Inês de Castro, e D. João, Grão-Mestre de Aviz, filho de D. Pedro e D. Teresa, o legista João das Regras apresenta de forma brilhante a exclusão de D. João filho de Inês de Castro (ao ler a carta do Papa Inocêncio VI em que se recusava a legitimar os filhos da união entre D. Pedro e D. Inês) e propondo abertamente o Mestre de Avis para Rei de Portugal. D. João tornar-se-ia D. João I, sendo eleito por “unida concordança de todos os grandes e comum povo”, segundo Fernão Lopes. Em 1387 D. João I casaria com D. Filipa de Lancaster, filha do Duque de Lancaster, fortalecendo ainda mais os termos do Tratado de Aliança Luso-Britânica (ou Aliança Anglo-Portuguesa, estabelecida em 1373, e renovada em 1386 com a assinatura do Tratado de Windsor assinado entre João I de Portugal e Ricardo II de Inglaterra). Deste casamento nascerá aquela que ficou conhecida por a “Ínclita Geração”, com o nascimento dos descendentes D. Duarte, D. Pedro, D. Henrique, D. Isabel e D. Fernando, que contribuíram em muito para o desenvolvimento de Portugal enquanto país e sociedade, deixando profundas marcas na nossa história, perdurando muitas delas até aos dias de hoje. A influência de Filipa de Lancaster foi de assinalar no que diz respeito às relações comerciais entre Portugal e Inglaterra, com o crescimento das importações portuguesas de vestuário ou bacalhau e as exportações de cortiça, vinho, azeite ou sal. No seguimento da eleição de D. João I, o Rei de Castela decide invadir pela 2ª vez Portugal, com o objetivo de tomar Lisboa e destronar o Mestre de Aviz. Mas desta vez o exército castelhano é acompanhado por um grande contingente de cavalaria francesa, dado que à época, Castela e França eram aliados em virtude do decurso da Guerra dos 100 anos. É aí que D. Nuno Álvares Pereira, já nomeado Condestável de Portugal, começa a preparar com D. João I uma grande armadilha ao exército adversário, com o apoio do exército inglês. A 14 de agosto de 1385 trava-se a decisiva batalha de Aljubarrota. O exército castelhano possuía uma vantagem de recursos de 4 para 1, mas foi praticamente aniquilado pelo exército português e pelos seus aliados ingleses. As forças castelhanas eram comandadas pelo Rei D. João I de Castela e pelo irmão de D. Nuno Álvares Pereira (neste caso Pedro Álvares), e deveriam ter uma dimensão próxima de cerca de 31 mil homens. Antecipando-se aos castelhanos, D. Nuno Álvares consegue procurar o terreno ideal para uma batalha onde partiria em desvantagem a nível de recursos, e acabaria por dispor as tropas portuguesas ao redor de uma colina, de frente para a estrada que traria os castelhanos ao seu encontro. O exército castelhano acabaria por chegar por volta do meio-dia, sob o Sol abrasador de agosto. No entanto, o confronto só se iniciaria por volta das 6 da tarde, com uma carga da cavalaria francesa sobre as linhas portuguesas. O exército português conseguiu repelir facilmente o ataque, e D. João I assistia ele próprio na retaguarda ao início da batalha e à vantagem que a configuração estreita do terreno dariam às forças portuguesas e inglesas. Com o falhanço da carga francesa, os castelhanos decidem optar por um ataque frontal com a sua infantaria, algo que também é neutralizado pela alteração da disposição das linhas portuguesas, que causou o esmagamento por entre os flancos portugueses, originando a debandada do exército castelhano do campo de batalha. Antes do pôr-do-sol a batalha estava ganha para os portugueses. Na batalha, morreram tantos nobres castelhanos que o reino vizinho ficou de luto durante quase dois anos. E aproveitando a vantagem conferida para o lado português no decurso da Batalha de Aljubarrota, D. Nuno Álvares Pereira decide, em pleno outubro de 1385, invadir Castela, entrando por Badajoz e seguindo em direção a Mérida, para que as forças castelhanas o defrontassem. Esta batalha ficaria conhecida para a história como a Batalha de Valverde, e a vitória seria também conseguida para o lado português, salvaguardando a coroa portuguesa e o reinado de D. João I, levando à assinatura de um tratado de aliança e paz em 1411, e oficializando o reconhecimento de Castela por D. João I como Rei de Portugal. Com a morte de D. João I de Castela em 1390, D. João I de Portugal pôde dedicar-se ao desenvolvimento económico e social do país. A partir daqui, o Rei de Portugal começaria uma política de centralização da governação, espaçando as reuniões das cortes, procurando reduzir a influência da nobreza e do clero, e apropriando-se inclusivamente dos bens daqueles que foram favoráveis ao apoio a Castela aquando da crise de sucessão. Em 1412 associa ao governo do reino o seu filho D. Duarte, futuro Rei de Portugal. E em 1415, D. João I, apoiado pelos seus filhos D. Duarte, D. Pedro e D. Henrique decidem iniciar a expansão territorial portuguesa além-fronteiras, com a conquista de Ceuta a 22 de agosto de 1415. Ceuta era uma cidade islâmica e rica no norte de África, com terrenos de cultivo bastante férteis em seu redor, que concentrava em si uma parte significativa do tráfego comercial do Mediterrâneo ocidental. A conquista de Ceuta permitira também controlar o estreito de Gibraltar, e a consequente entrada e saída dos navios entre o oceano Atlântico e o mar Mediterrâneo, impedindo também os ataques às cidades do Algarve com base nos piratas oriundos ou baseados em Ceuta. Foram muitas as causas que levaram à conquista de Ceuta, desde económicas, religiosas, políticas ou geoestratégicas, mas o que é certo, é que esse acontecimento marcaria profundamente a história do nosso país, pois marcou uma nova política de expansão territorial de Portugal, apelando ao desenvolvimento da tecnologia naval e militar. A batalha de conquista de Ceuta foi uma batalha extremamente rápida e a conquista do território revelou-se um êxito militar. A 21 de agosto o desembarque de 212 navios ao largo de Ceuta foi realizado, e no dia seguinte Ceuta caía nas mãos portuguesas, sem grande resistência por parte dos muçulmanos, onde as forças portuguesas beneficiaram largamente do efeito surpresa e principalmente da não mobilização atempada dos exércitos muçulmanos. Na primeira missa realizada em Ceuta, os três príncipes da Ínclita geração foram nomeados cavaleiros pelo seu pai. Com o sucesso desta vitória, iniciaram-se também os “Descobrimentos” portugueses: a ilha de Porto Santo (1418), a Ilha da Madeira (1419) e os Açores (1427) seriam os próximos territórios a serem anexados ao domínio da coroa portuguesa. E o povoamento dos arquipélagos dos Açores e da Madeira é iniciado inclusivamente prontamente. Ainda no reinado de D. João I, o Rei organizaria também expedições às já conhecidas Ilhas Canárias. D. João I viria a falecer a 14 de agosto de 1433, sendo sepultado no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha.

Principais pontos a destacar na governação de D. João I:
• Inicia a dinastia de Aviz;
• Vence a guerra com Castela e garante a independência de Portugal;
• Aprofunda a aliança com os ingleses via assinatura de Tratado de Windsor e casamento com Filipa de Lancaster;
• Desenvolve a melhoria das condições económicas do país;
• Inicia a expansão portuguesa, com a conquista de Ceuta e os primeiros descobrimentos.

D. Duarte I "O Eloquente" (1433 - 1438)

D. Duarte
D. Duarte nasceu em Viseu, em outubro de 1391, e seria o décimo primeiro Rei de Portugal, subindo ao trono em 1433. Seria também o Rei que, até então, menos tempo governaria (apenas cinco anos), apesar de desde muito jovem ter acompanhado seu pai na governação do reino. De recordar que em 1412, 21 anos antes de subir ao trono como Rei, foi formalmente associado à Governação do Reino, tornando-se braço direito de seu pai. A partir de 1433, D. Duarte torna-se um monarca preocupado em gerar consensos, tendo convocado as Cortes várias vezes para discutir assuntos de Estado (as Cortes haveriam de reunir cinco vezes, em cinco anos de reinado do Rei). As Cortes por várias vezes haviam insistido com D. João I para que organizasse uma coletânea das leis para tornar mais fácil a coordenação da justiça. É D. Duarte que acaba por dar indicação para esse trabalho avançar, algo que apenas ficaria concluído em 1446, ficando conhecida por Ordenações Afonsinas ou Código Afonsino. Este código, que seria aprovado por Afonso V, viria a esclarecer a aplicação do direito romano em Portugal e seria a primeira compilação geral de leis no nosso país. Apesar de D. Duarte ter um reinado curto, ainda conseguiria promulgar a Lei Mental, uma legislação que se destinava a defender os direitos e bens da coroa portuguesa, no seguimento das Cortes de Santarém em 1434. Esta Lei permitiu que à Coroa reaver muitos domínios territoriais, pois determinada que os bens doados pela coroa só podiam ser herdados pelo filho varão primogénito. D. Duarte continuou a política de conquistas em África e a exploração marítima, muito facilitada também pela intervenção do seu irmão D. Henrique que ao estabelecer-se em Sagres, ficaria conhecido como o grande impulsionador dos Descobrimentos portugueses. Os navegadores portugueses, nos primeiros tempos, navegavam de forma a contornar a costa africana e a mantê-la sob vista, pelo que não tardaria muito até que novas técnicas de navegação tivessem de ser aplicadas. Aconteceria aquando da dobragem do Cabo Bojador, por Gil Eanes, em 1434. O Cabo Bojador era, até então, conhecido como o Cabo do Medo, fruto dos seus recifes de arestas aguçadas, tornando aquela zona de navegação muito arriscada. Para além do mais, a profundidade do nível das águas é muito baixa junto à costa, o que tornava praticamente impossível contornar esse cabo, a não ser que essa navegação fosse feita em alto mar. O sucesso de Gil Eanes resultaria porque este arriscou em afastar-se da costa africana, dobrando finalmente o Cabo Bojador e abrindo a porta para a exploração do Atlântico Sul. De seguida, os descobrimentos portugueses avançam para Angra dos Ruivos (1435) e o Rio do Ouro e Pedra da Galém (1436). O ano de 1437 resulta num ataque a Marrocos, para consolidar a presença portuguesa naquela região, sendo D. Duarte convencido pelos seus irmãos D. Henrique e D. Fernando, apesar da oposição D. Pedro e D. João, outros dois irmãos que não concordavam com o plano. Esta campanha havia sido preparada com tempo, pois nas Cortes de Évora de 1436 haveria de ser decidido que a coroa portuguesa procurasse um empréstimo para financiar esta campanha no ano seguinte. A campanha, dirigida à cidade de Tânger, foi mal sucedida, saindo os portugueses derrotados e com grandes perdas em batalha. Os portugueses conseguem obter uma trégua para se retirarem, ficando o príncipe D. Fernando como refém. Os muçulmanos exigiram pela libertação do príncipe a devolução da cidade de Ceuta, algo que seria colocado à consideração e debatido nas Cortes de Leiria de 1438, embora viesse a ser rejeitado pelos portugueses. O príncipe D. Fernando viria a falecer no cativeiro em 1443, mas antes disso o seu irmão D. Duarte morreria ainda no ano de 1438, em Tomar, infetado pela peste negra.

Principais pontos a destacar na governação de D. Duarte:
• Inicia a preparação da revisão da legislação portuguesa;
• Mantém a aposta nos Descobrimentos Portugueses;
• Perde a campanha de Tânger, custando muitas baixas, incluindo o seu irmão D. Fernando.

D. Afonso V "O Africano" (1438 - 1481)

D. Afonso V
Afonso V nasceu em Sintra, a 15 de janeiro de 1432, mas foi obrigado a suceder ao seu pai D. Duarte em 1438, com seis anos de idade. Sua mãe, D. Leonor de Aragão, assumiu a regência do reino durante os primeiros meses, em linha com o expressado no testamento do Rei D. Duarte. No entanto esta regência foi muito criticada, pois Leonor de Aragão era estrangeira, e reacendeu o debate nacionalista que havia surgido décadas antes e que motivaria a ascensão de D. João I. Em 1439 a regência é retirada a D. Leonor, e por decisão das Cortes é entregue a D. Pedro, irmão de D. Duarte e tio de D. Afonso. D. Pedro procurou, como regente, concentrar o poder na figura do Rei. E é na sua regência que são concluídas as Ordenações Afonsinas, a primeira coligação de leis no século XV. Portugal pode prosperar durantes este período, mas devido à centralização de poderes, o ambiente político interno não era o melhor, pois os nobres sentiam a sua ambição condicionada pelo Regente D. Pedro. O ambiente de crispação com os nobres continuaria, e D. Afonso, Conde de Barcelos, meio irmão de D. Pedro, começaria a conspirar pelo poder. Mas D. Pedro, para garantir a influência junto do seu sobrinho (Afonso V), organizaria o casamento deste com sua filha Isabel. Entre 1441 e 1448, continuaria a epopeia portuguesa de exploração marítima. A caravela portuguesa, um novo tipo de embarcação, é a protagonista do avanço português. O Infante D. Henrique, apoiado pelo seu irmão D. Pedro, organiza a chegada ao Cabo Brando (1441), à Baía de Arguim (1443), a chegada ao rio Senegal e a dobragem do Cabo Verde (1444), estes últimos por Dinis Dias. O arquipélago de Cabo Verde apenas seria descoberto mais tarde supostamente em 1456 por Diogo Gomes. Em 1448, a 9 de junho, D. Afonso V assume o governo do Reino ao atingir a maioridade e a 15 de setembro anula todos os editais aprovados durante a regência de seu tio, pondo em causa o trabalho do tio D. Pedro e declarando-o rebelde e inimigo do Reino. O Rei fora aconselhado por seu tio bastardo D. Afonso, já Duque de Bragança, pelo Conde de Ourém e pelo arcebispo de Lisboa para afastar do Governo o seu tio D. Pedro, e aí, Afonso V realiza então uma aliança com o seu tio D. Afonso, para defrontar D. Pedro, Duque de Coimbra, na batalha de Alfarrobeira, a 20 de maio de 1449. D. Pedro seria morto nesta batalha e D. Afonso V e seu tio Afonso sairiam vitoriosos. D. Afonso, Duque de Bragança, com a morte de D. Pedro, aumentou ainda de forma mais considerável o seu poder de influência junto do Rei. Afonso V passa a concentrar a sua atenção nas questões da expansão territorial no Norte de África. A 18 de junho de 1452, o Papa Nicolau V emite a Bula Dum Diversas, autorizando os portugueses a conquistar territórios não cristianizados, assim como a tomar como escravos qualquer pagão ou muçulmano presentes nos novos territórios capturados. Com a queda de Constantinopla em 1453 e o pedido de cruzada pelo Papa Calisto III em 1456, Afonso V prepara um grande exército, mas como a cruzada acaba por não ocorrer, D. Afonso V retoma finalmente a campanha no Norte de África e conquista Alcácer Ceguer (1458), Anafé (1464) e Arzila, Tânger e Larache (1471). Em 1460, morre o Infante D. Henrique e as viagens de exploração marítima não voltaram a ter continuidade ao longo do reinado de Afonso V, que para além da guerra e da expansão territorial, se viria a mostrar muito pouco preocupado com o desenvolvimento do comércio e a administração do Reino. Já em 1469, nove anos após a morte do Infante D. Henrique, D. Afonso V concede por arrendamento o monopólio do comércio no golfo da Guiné a Fernão Gomes da Mina, durante cinco anos, em troca de uma renda anual e comprometendo-se Fernão Gomes a avançar a exploração da costa da Guiné em 100 léguas ao ano. Fernão Gomes iria promover a exploração da costa atlântica de África, chegando ao cabo de Santa Catarina. Em 1471 chegaria à Mina, onde descobriu o comércio do ouro, e com os lucros obtidos, Fernão Gomes pode financiar a campanha de 1471, onde Afonso V conquistaria as três praças marroquinas já mencionadas. Com a campanha africana terminada, Afonso V orientou a sua atenção para a política a nível da Península Ibérica. O Rei Henrique IV de Castela viria a falecer em 1474, deixando como única herdeira sua filha D. Joana. Mas o Rei Henrique IV era tido como homossexual, pelo que a nobreza e o clero não acreditavam que D. Joana fosse filha do Rei. É aí que parte do clero e da nobreza elegem como favorita ao trono D. Isabel, irmã de D. Henrique e tia de D. Joana. Afonso V interfere neste processo, e em 1475 casa com D. Joana de Castela e assumindo a sua pretensão ao trono. Afonso V decide invadir o Reino de Castela, mas a campanha militar resulta num fracasso. As forças castelhanas estavam divididas em dois blocos: o bloco afeto à princesa D. Joana e o bloco afeto a D. Isabel. O Rei de Aragão, Fernando II, apressa-se a casar com D. Isabel para garantir também o seu direito ao trono. Na batalha de Toro ocorre um dos pontos altos desta crise, com ambos os blocos militares a se defrontarem, a 1 de março de 1476, entre um número de forças muito semelhante para ambos os lados. Apesar do resultado da batalha ter sido inconclusivo, do ponto de vista estratégico marcou o destino de Portugal: o Reino de Aragão acabaria por se unir ao Reino de Castela (Afonso V teria ainda tentado obter o apoio incondicional de Luís XI de França, mas não conseguindo obter esse apoio, regressaria a Portugal extremamente abatido. O Rei Francês acabaria por preferir reconhecer o direito ao trono de Fernando II e de Isabel, em troca destes romperem a sua aliança com o Duque de Borgonha, o seu principal inimigo, algo que resultou num sério revés diplomático para Portugal, dado que no início do conflito Portugal havia conseguido o apoio da França). Afonso V assina o Tratado de Alcáçovas, a 4 de setembro de 1479, colocando fim à Guerra de Sucessão de Castela. Este tratado foi ratificado em Toledo a 6 de março de 1480, formalizando o fim das hostilidades entre Portugal e Castela, e abdicando Afonso V de procurar legitimar a sua pretensão sobre o trono de Castela. Castela, por sua vez, abdicaria de quaisquer direitos sobre a exploração a sul do Cabo Bojador, ficando Portugal com todas as suas posses e Castela apenas com as ilhas Canárias. A assinatura deste Tratado e os eventos anteriores ao mesmo contribuíram para provocar uma depressão em Afonso V. O Rei abdicaria a favor do seu filho, o futuro Rei D. João II de Portugal, e Afonso V morreria em Sintra em 1481.

Principais pontos a destacar na governação de D. Afonso V:
• Instabilidade política interna e perseguição ao seu tio D. Pedro;
• Conquistas no norte de África, com a anexação de várias praças;
• Continuação das descobertas ao largo da costa africana;
• Falta de visão no desenvolvimento administrativo do Reino;
• Derrota na Guerra da Sucessão de Castela, perdendo a hipótese de ser o primeiro Rei Português a governar Castela.